
A família é o grupamento humano mais antigo que existe. Na pré-história os primeiros hominídeos viviam em pequenos grupos compostos normalmente de um casal, filhos e por vezes, quando conseguiam alcançar idade para tal, de avós. Caçavam pequenos animais e coletavam os recursos que podiam e depois se reuniam para comer esses alimentos – a princípio crus e depois, após a descoberta do fogo- assados ou cozidos, ao redor de suas fogueiras para conversar e compartilhar suas experiências. Com o desenvolvimento da agricultura, da pecuária e do comércio, novos ingredientes foram incorporados ao menu dos diversos povos e então começaram a surgir as primeiras receitas. Essas foram aos poucos sendo ampliadas, aprimoradas e difundidas. A princípio apenas de família para família depois para outras pessoas e também outros lugares onde foram também adaptadas de acordo com os hábitos alimentares e disponibilidade de ingredientes. Durante a chamada “idade das trevas “, época em que o conhecimento estava restrito aos mosteiros, as pessoas precisavam cozinhar e comer e apesar da pobreza e da escassez de recursos, assados e cozidos foram aos poucos sendo desenvolvidos. Aqui no Brasil os primeiros imigrantes, a princípio apenas europeus, portugueses principalmente e africanos- esses como escravos- e depois árabes e orientais trouxeram sua cultura, religião e também seus modos de preparar a comida. Como muitos desses imigrantes não encontraram por aqui os alimentos que usavam em sua terra natal, eles tiveram que adaptar as suas receitas. Laços de amizade e matrimoniais foram sendo criados e as pessoas passaram a se visitar de forma não apenas em ocasiões solenes, mas também informalmente. Suas receitas foram aos poucos passadas para outras gerações até os dias de hoje. Por isso não é exagero algum dizer que as famílias são as verdadeiras guardiãs das tradições culturais e gastronômicas de um povo
No final do ano passado me caiu em mãos o livro de receitas da minha mãe. Folheando aquelas páginas amarelecidas pelo tempo, com algumas manchas de gordura, de tanto que foram manuseadas eu não pude conter as lágrimas. Ali estavam preciosidades como Sopa de aspargos (Yeda). Vatapá de Silvia (Delicioso), “Estrogonofe de Martha “, “bolo de milho de Marisa – e para o meu lisonjeio, uma receita minha- e também várias outras de autoria desc9onhecida como cocktails, aperitivos, pratos, sobremesas e docinhos que fizeram parte da minha infância e adolescência, feitos na casa da minha mãe e/ou das tias, as vezes em ocasiões especiais como aniversários, natal e ano novo ou simplesmente no dia a dia. Apesar de algumas dessas receitas ainda serem usadas hoje em dia, caso do ESTROGONOFE – Escrito assim mesmo- e do picadinho, muitas caíram em desuso, afinal esse caderno começou a ser escrito no início dos anos 60 quando não havia produtos importados bem como muito dos hortifrutis também não eram encontrados frescos caso dos aspargos e cogumelos. Por isso é natural que com o aumento da oferta de ingredientes novas preparações sejam criadas embora as antigas também sejam ótimas.
As receitas de família as quais me refiro e que também intitulam essa coluna são aquelas que embora constem do seu repertório não são necessariamente de autoria delas mas aquelas que nos dão água na boca, o que nos fazem dizer “ ahhhh, mesmo sendo de outras pessoas quando são como por exemplo um bolo de carne envolto em bacon feito rotineiramente lá em casa e que nós adorávamos tinha também o cozido da mamãe, esse sim, uma comida mais festiva bem como o fetuccine com tomate e gorgonzola que ela fazia apenas no dia 25 de dezembro e o famoso bolo de meia hora , por isso mesmo que várias receitas não sejam da minha mãe, elas estão nesse caderno. Como homenagem a minha mãe, dona Vera e todas e as pessoas maravilhosas que as escreveram, vou deixar uma entrada, um prato e uma sobremesa.
Mousse de presunto (Tia Henriqueta)
Duas latas de creme de leite sem o soro, 6 folhas de gelatina branca, 2 latas de patê de presunto, 1 vidro pequeno de picles, ½ copo de água morna, mostarda e molho inglês a gosto.
Modo de fazer: Amasse o patê com a mostarda e o molho inglês, junte o creme de leite e os picles bem picadinho, e misture com a gelatina hidratada com a água morna. Coloque em uma forma de bolo untada com óleo e leve à geladeira por algumas horas. Desenforme e sirva em fatias. Fetuccine ao molho de gorgonzola (mamãe) Meio pacote de fetuccine cozido al dente, 2 latas de pomarola tradicional, mesmo peso de gorgonzola, 1lata de creme de leite e 1 colher de sopa de claybon.
Derreta o queijo com pomarola e o creme de leite. Refogue o macarrão no claybon e misture com o molho bem quente.
Sorvete crocante (Tia Martha)
1 caixa de sorvete de creme de 2 kg 2 xícaras de açúcar e 1 de amêndoas picadas.
Modo de fazer: Retire o sorvete e deixe amolecer dentro de um bowl. Derreta o açúcar e quando caramelizar, juntar as amêndoas e misturar. Espalhe sobre uma superfície de mármore ou granito. Quando esfriar bata com um socador até virar uma farofa. Em seguida misture esse crocante ao sorvete, ponha em um pirex e leve ao congelador até a hora de servir.
A quantidade de pessoas por receita varia de acordo com o apetite de cada uma, mas em geral todas elas servem bem umas 08 pessoas. A mousse talvez mais. Em relação medidas – xícaras e colher – e aos ingredientes fui 100 % fiel as receitas. Podem ter certeza de que ainda hoje vão abrilhantar qualquer ocasião. Para beber deixo ao critério dos leitores afinal antigamente não tínhamos a variedade de cervejas, vinhos e espumantes que temos hoje, mas todo almoço ou jantar terminavam com um café passado no coador. Máquinas de café expresso são bem mais recentes.
Renato Justo
Chef de Cozinha
@verde_tinto
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